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sexta-feira, 14 de junho de 2013

Abrigadas, crianças e adolescentes aguardam por novos pais e um lar




PRISCILLA THOMPSON | ppessini@redegazeta.com.br

Sentada em um canto ao lado do rádio, Paula (nome fictício), 11 anos, observa os três irmãos mais novos. Com lágrimas nos olhos, não sabe dizer se gostaria de estar em casa ou ali, no abrigo para onde eles foram levados há quase um ano. Filhos de pais usuários de drogas, os quatro foram retirados de casa e, agora, esperam a conclusão do processo de destituição do poder familiar – ação movida contra os pais que infringem algum dever legal. Só então, poderão ter a chance de ganhar uma nova família.

Segundo o Tribunal de Justiça do Estado, apenas 15% das 854 crianças abrigadas no Estado, hoje, estão liberadas para a adoção. Elas já passaram pelo processo de destituição do poder familiar e aguardam a oportunidade de viver com novos pais. Do restante, 159 aguardam a conclusão desses processos para entrar na fila da adoção – como é o caso de Paula e seus irmãos –, e 564 aguardam o retorno para suas famílias.

A coordenadora das Varas da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça do Estado, Janete Pantaleão, explica que isso acontece porque as primeiras tentativas do juizado, quando a criança chega ao abrigo, são sempre no sentido de levá-la de volta ao convívio familiar. Para isso, oferece apoio aos pais, aos parentes mais próximos e, claro, às crianças.

Tentativas

“Se os pais estão em tratamento contra as drogas, por exemplo, aguardamos para verificar se eles terão condições de recebê-las novamente, o que é sempre mais desejável. Se não, buscamos por parentes mais próximos. Quando nenhum desses caminhos é possível ou quando eles não são as melhores opções para a criança, damos início ao processo de destituição do poder familiar”, explica.
Demora

Os procedimentos, no entanto, às vezes levam meses e até anos para serem concluídos. E quanto mais tempo no abrigo, menores as chances de a criança conseguir um novo lar, já que a maioria dos interessados em adotar desejam filhos com idades de até 2 anos.

Paula, por exemplo, fará 12 anos este ano, e sabe que dificilmente despertará o interesse de uma família para adoção. Mais difícil, ainda, será conseguir alguém que adote todos os irmãos de uma só vez. Casos como esses acabam indo para a adoção internacional, explica Janete. “É difícil encontrar famílias dispostas a adotar grupos de irmãos no Brasil. Isso é mais comum no exterior”, diz.

Exigências

Atualmente, 784 homens e mulheres estão na fila para adoção no Estado. Desses, 404 desejam crianças com, no máximo, 2 anos de idade. Mas nos 92 abrigos existentes no Estado não há nenhuma criança nessa idade apta a ser adotada. A maioria tem mais de 9 anos.

Janete reconhece que a demora em alguns processos pode dificultar o sucesso das adoções, mas garante que todo esforço é feito para agilizá-los. “Buscamos pelas famílias num prazo de cerca de seis meses. Quando não obtemos resultado, passamos para a fase da destituição, que demora outros seis meses, mais ou menos. Esse tempo, porém, pode ainda mais rápido, dependendo do caso”, diz.

O juizado também faz um trabalho de conscientização dos candidatos, estimulando a adoção tardia (de crianças mais velhas). E lembra que o Cadastro Nacional de Adoção amplia as chances de oferecer um novo lar a essas crianças.

“Temos conseguido grandes avanços nos últimos anos, como o aumento no número de pais interessados em adotar crianças com idades maiores que 3, 4 anos. Ainda não é uma situação ideal, mas acredito que estamos no caminho”, avalia.

Família quase completa

O casal de servidores públicos Marcia Anita Silva de Oliveira, 36 anos, e José Alexandre Pereira, 42, aguarda a conclusão do processo de destituição do poder familiar da pequena Laura (nome fictício), de 3 anos, para iniciar o processo de adoção do seu segundo filho. O primeiro é o Lucas, também de 3 anos, adotado em 2010.

Laura já vive com a nova família graças à guarda provisória conquistada por Marcia e José na Justiça. “A espera pelo processo de adoção às vezes é demorado, mas sei que é necessário. Tenho fé que vai correr tudo bem, como foi o Lucas. Estamos prestes a nos tornarmos uma família completa”, conta.

Maioria está no abrigo por maus-tratos

Negligência, maus-tratos e consumo de álcool e outras drogas são os principais motivos que levam crianças e adolescentes para os abrigos do Estado. Um problema que cresce cada vez mais, explica a coordenadora das Varas da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça do Estado, Janete Pantaleão.

“As varas de infância e juventude no Estado têm uma demanda enorme nesse sentido. São problemas que têm solução, mas não a curto prazo. Por isso, normalmente precisamos aguardar até saber se a criança pode ou não voltar para os pais. E por isso elas precisam ficar nos abrigos”, diz.
A cada seis meses, a situação de cada criança abrigada precisa ser reavaliada pelo juizado. Esse acompanhamento que garante o andamento das ações e evita a permanência de crianças e adolescentes nos abrigos por mais do que dois anos – prazo máximo determinado pela lei.
Esforço conjunto

A coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude do Ministério Público Estadual, a promotora Andrea Teixeira de Souza, explica que o esforço para o andamento dos processos é conjunto e que a adoção é considerada o último recurso.

“O Ministério Público é quem ajuiza as ações de destituição do poder familiar. Fazemos todos os esforços para que a criança tenha o melhor possível no menor tempo possível, mas a demanda é, realmente, muito grande. A adoção nunca pode ser o primeiro recurso, mas sim o último”, diz.

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